Our backyard
António Azenha
2014
até 
15
November 2014
Círculo Sede
Our backyard

Our backyard

Exposição Coletiva

Our backyard

Exposição Coletiva

18
October 2014
a
15
November 2014
Círculo Sede

Brinquedos numa casa em Coimbra

  1. Habitação é sinónimo de habitar — viver e ser num espaço em que nos abriga. A ARTE É TAMBÉM UMA HABITAÇÃO PARA O ARTISTA, o espaço preciso que esse habita e onde é.

    O espaço da habitação evoluiu ao longo do tempo e, paralelamente, à história da arte. Desde logo complexificando-se, mediante compartimentação e especialização do interior.

    A sua multiplicação e associação deu também lugar aos aglomerados urbanos, lugar onde a civilização se desenvolveu em grande medida. A cidades definiram-se por oposição ao exterior natural, num aglomerado de espaços construídos e livres, incluindo espaços exteriores mas diretamente associados à casa e muitas vezes vividos pelos seus habitantes.

    Bachelar fala-nos da «poética da casa», na forma como as nossas memórias das casas que habitamos nos marcam.

    Vidler por seu lado recorda-nos como a expressão «uncanny» de Freud, remete para uma sensação mista de familiaridade e temor. Por exemplo, quando nos encontramos DEFRONTE Á NOSSA CASA DE INFÂNCIA JÁ NÃO HABITADA. Como se naquele espaço, de pequena escala, já não pudéssemos albergar a nossa intimidade. Uma inversão do «sublime» que atraiu muitos pensadores, o que se pode ilustrar como a sensação sentida quando sozinhos perante a imensidade de certas paisagens.

    A casa é símbolo do privado e da vida privada. «Domus» por oposição á «urbe», ou melhor à «civitas» — o lugar público.
  2. A casa é, para a criança, um mundo, onde se reconhece e aos seus. Um espaço imenso que apropria e onde desenvolve as suas actividades e faculdades.

    Sem nos retermos nas fases de desenvolvimento da criança — do recém-nascido à puberdade — tudo conleva a tal.

    Entre que as várias atividades, estão as primárias de comer, dormir e brincar. «Brincar» é anterior à conceptualização e linguagem, símbolo do humano racional maduro. BRINCAR NÃO SE RESTRINGE À CRIANÇA, e pode protelar-se na forma como jogamos a sociabilidade – por excelência no espaço público. Mas também no espaço privado, o qual está repleto de protocolos, individuais ou emanados do exterior social. E a família é esse mais pequeno núcleo social.

    Ao brincar, a criança lida e aprende a relacionar-se com o mundo. Tudo se inicia no restrito espaço do berço, com movimento de olhos, até a movimentações ocorridas com o desenvolvimento motor e, progressivamente, com a manipulação de objectos que subvertem o espaço.

    O pequeno mundo estende-se, por vezes aos espaços contíguos do exterior. Ás denominadas traseiras – o «backyard» da habitação torna-se para quem dele usufrui um local mágico onde tudo pode acontecer.
  3. Não nos parece desoportuno estabelecer uma relação entre o espaço que alberga a presente exposição e a história dos espaços da arte.

    Como sabido, a arte foi uma das formas primitivas de ordenar o «caos» do mundo. Progressivamente, tornou-se algo específico e distante do quotidiano do mortal. Entregue a uma suposta «genialidade» do artista romântico, a arte percorreu um percurso de exclusividade.

    O museu e as galerias tornaram-se nos espaços de exposição da arte por excelência. Distantes e sobretudo congelados na sua própria temporalidade.

    Bidimensionalmente pendurando arte em paredes e tridimensionalmente assentando-a em pedestais. Seria preciso o século XX para TRAZER A ARTE PARA A VIDA E FAZER DA VIDA ARTE.

    A meio do século houve um questionar dos espaços convencionais da arte. O «pop» apropriou o banal quotidiano, a instalação e performance apelaram a que a vivamos, e o «ready-made» e o «conceptual» sofisticaram as relações estabelecidas com a arte. Os «ateliers», e depois a rua, tornam-se lugares propícios ao albergue da arte e seus desenvolvimentos. O espaço privado, e a casa em particular, tornaram-se também em espaços de arte, espaços que o artista abre ou apropria para uma qualquer manifestação artística. Manifestações igualmente dignas e, eventualmente, mais genuínas.

    O espaço desta exposição entende-se nesta história dos espaços expositivos.
  4. Por outro lado, os objetos escultóricos também expandiram o seu «campo». Não no sentido de Krauss, num caminho que passa pela «Land-art», mas no sentido da sua própria materialidade. Construídos com uma materialidade pré-existente, recontextualizada, adquiriram uma nova significação.

    No presente caso — objectos escultóricos feitos de brinquedos — a referida reutilização adquire uma profundidade signica ainda maior.

    Um brinquedo é um objecto único, que acompanha a criança NO INFINITO QUE É TEMPO DE UMA BRINCADEIRA. Encarna o imaginário denso que as crianças sonharam. Neste sentido, estes objectos escultóricos podem incluso nos parecer traumáticos — se entendidos enquanto perda de tal.

    Mas, por outro lado, tornados arte, entronizam o sonho dessas crianças em qualquer espectador. Dignificam o «brincar» e a criança na dimensão partilhável que é a «arte».
  5. As esculturas «Toys Re Re-play», agora mostrada num espaço mais convencional, ganham com esta re-situação numa habitação, um contexto ainda mais própicio ao seu usufruto e experiência estética. Os visitantes, mais que espectadores, podem expandir a sua imaginação à sua infância passada ou ao limite do sonho.

    Remetemos também anteriormente para a relação entre o brincar e a linguagem. No presente caso, a associação da escrita criativa com a escultura é demais oportuna. Uma escrita que NÃO PRETENDE EXPLICAR A ARTE, MAS ANTES EXPANDE A SUA SIGNIFICAÇÃO, circunscrevendo o espaço do sonho. É decididamente uma associação feliz.

    A experiência estética proposta é ainda alargado por outras linguagens, e o seu previsto registo em livro, mais não poderá ambicionar ser do que isso mesmo — um mero «arquivo».
  6. Nos últimos tempos, tenho acompanhado o trabalho desenvolvido por António Azenha.

    «Our Backyard» é um resultado coerente e consistente desse percurso. A sua exposição no âmbito da representatividade do CAPC (Círculo de Artes Plásticas de Coimbra) mas, em particular, nesta habitação que alberga a instituição na cidade de Coimbra, é uma escolha feliz. Incentiva-nos a viver a arte na sua magnânima expressão, a sonhar e imaginar. E essa é uma das funções mais intrínsecas de uma arte que tenha sentido num momento pautado pelas indecisões contemporâneas e alegada crise mundial.

    Estamos perante uma manifestação artística em intimidade doméstica, mas que não deixa de apelar a uma reflexão sobre o «sublime» público sobre a POSSIBILIDADE DE ACÇÃO POLÍTICA DA ARTE, NOS SEUS ESTRITOS LIMITES. E mesmo aos domingos.

Gonçalo Furtado
Coimbra, Maio 2013

Brinquedos numa casa em Coimbra

  1. Habitação é sinónimo de habitar — viver e ser num espaço em que nos abriga. A ARTE É TAMBÉM UMA HABITAÇÃO PARA O ARTISTA, o espaço preciso que esse habita e onde é.

    O espaço da habitação evoluiu ao longo do tempo e, paralelamente, à história da arte. Desde logo complexificando-se, mediante compartimentação e especialização do interior.

    A sua multiplicação e associação deu também lugar aos aglomerados urbanos, lugar onde a civilização se desenvolveu em grande medida. A cidades definiram-se por oposição ao exterior natural, num aglomerado de espaços construídos e livres, incluindo espaços exteriores mas diretamente associados à casa e muitas vezes vividos pelos seus habitantes.

    Bachelar fala-nos da «poética da casa», na forma como as nossas memórias das casas que habitamos nos marcam.

    Vidler por seu lado recorda-nos como a expressão «uncanny» de Freud, remete para uma sensação mista de familiaridade e temor. Por exemplo, quando nos encontramos DEFRONTE Á NOSSA CASA DE INFÂNCIA JÁ NÃO HABITADA. Como se naquele espaço, de pequena escala, já não pudéssemos albergar a nossa intimidade. Uma inversão do «sublime» que atraiu muitos pensadores, o que se pode ilustrar como a sensação sentida quando sozinhos perante a imensidade de certas paisagens.

    A casa é símbolo do privado e da vida privada. «Domus» por oposição á «urbe», ou melhor à «civitas» — o lugar público.
  2. A casa é, para a criança, um mundo, onde se reconhece e aos seus. Um espaço imenso que apropria e onde desenvolve as suas actividades e faculdades.

    Sem nos retermos nas fases de desenvolvimento da criança — do recém-nascido à puberdade — tudo conleva a tal.

    Entre que as várias atividades, estão as primárias de comer, dormir e brincar. «Brincar» é anterior à conceptualização e linguagem, símbolo do humano racional maduro. BRINCAR NÃO SE RESTRINGE À CRIANÇA, e pode protelar-se na forma como jogamos a sociabilidade – por excelência no espaço público. Mas também no espaço privado, o qual está repleto de protocolos, individuais ou emanados do exterior social. E a família é esse mais pequeno núcleo social.

    Ao brincar, a criança lida e aprende a relacionar-se com o mundo. Tudo se inicia no restrito espaço do berço, com movimento de olhos, até a movimentações ocorridas com o desenvolvimento motor e, progressivamente, com a manipulação de objectos que subvertem o espaço.

    O pequeno mundo estende-se, por vezes aos espaços contíguos do exterior. Ás denominadas traseiras – o «backyard» da habitação torna-se para quem dele usufrui um local mágico onde tudo pode acontecer.
  3. Não nos parece desoportuno estabelecer uma relação entre o espaço que alberga a presente exposição e a história dos espaços da arte.

    Como sabido, a arte foi uma das formas primitivas de ordenar o «caos» do mundo. Progressivamente, tornou-se algo específico e distante do quotidiano do mortal. Entregue a uma suposta «genialidade» do artista romântico, a arte percorreu um percurso de exclusividade.

    O museu e as galerias tornaram-se nos espaços de exposição da arte por excelência. Distantes e sobretudo congelados na sua própria temporalidade.

    Bidimensionalmente pendurando arte em paredes e tridimensionalmente assentando-a em pedestais. Seria preciso o século XX para TRAZER A ARTE PARA A VIDA E FAZER DA VIDA ARTE.

    A meio do século houve um questionar dos espaços convencionais da arte. O «pop» apropriou o banal quotidiano, a instalação e performance apelaram a que a vivamos, e o «ready-made» e o «conceptual» sofisticaram as relações estabelecidas com a arte. Os «ateliers», e depois a rua, tornam-se lugares propícios ao albergue da arte e seus desenvolvimentos. O espaço privado, e a casa em particular, tornaram-se também em espaços de arte, espaços que o artista abre ou apropria para uma qualquer manifestação artística. Manifestações igualmente dignas e, eventualmente, mais genuínas.

    O espaço desta exposição entende-se nesta história dos espaços expositivos.
  4. Por outro lado, os objetos escultóricos também expandiram o seu «campo». Não no sentido de Krauss, num caminho que passa pela «Land-art», mas no sentido da sua própria materialidade. Construídos com uma materialidade pré-existente, recontextualizada, adquiriram uma nova significação.

    No presente caso — objectos escultóricos feitos de brinquedos — a referida reutilização adquire uma profundidade signica ainda maior.

    Um brinquedo é um objecto único, que acompanha a criança NO INFINITO QUE É TEMPO DE UMA BRINCADEIRA. Encarna o imaginário denso que as crianças sonharam. Neste sentido, estes objectos escultóricos podem incluso nos parecer traumáticos — se entendidos enquanto perda de tal.

    Mas, por outro lado, tornados arte, entronizam o sonho dessas crianças em qualquer espectador. Dignificam o «brincar» e a criança na dimensão partilhável que é a «arte».
  5. As esculturas «Toys Re Re-play», agora mostrada num espaço mais convencional, ganham com esta re-situação numa habitação, um contexto ainda mais própicio ao seu usufruto e experiência estética. Os visitantes, mais que espectadores, podem expandir a sua imaginação à sua infância passada ou ao limite do sonho.

    Remetemos também anteriormente para a relação entre o brincar e a linguagem. No presente caso, a associação da escrita criativa com a escultura é demais oportuna. Uma escrita que NÃO PRETENDE EXPLICAR A ARTE, MAS ANTES EXPANDE A SUA SIGNIFICAÇÃO, circunscrevendo o espaço do sonho. É decididamente uma associação feliz.

    A experiência estética proposta é ainda alargado por outras linguagens, e o seu previsto registo em livro, mais não poderá ambicionar ser do que isso mesmo — um mero «arquivo».
  6. Nos últimos tempos, tenho acompanhado o trabalho desenvolvido por António Azenha.

    «Our Backyard» é um resultado coerente e consistente desse percurso. A sua exposição no âmbito da representatividade do CAPC (Círculo de Artes Plásticas de Coimbra) mas, em particular, nesta habitação que alberga a instituição na cidade de Coimbra, é uma escolha feliz. Incentiva-nos a viver a arte na sua magnânima expressão, a sonhar e imaginar. E essa é uma das funções mais intrínsecas de uma arte que tenha sentido num momento pautado pelas indecisões contemporâneas e alegada crise mundial.

    Estamos perante uma manifestação artística em intimidade doméstica, mas que não deixa de apelar a uma reflexão sobre o «sublime» público sobre a POSSIBILIDADE DE ACÇÃO POLÍTICA DA ARTE, NOS SEUS ESTRITOS LIMITES. E mesmo aos domingos.

Gonçalo Furtado
Coimbra, Maio 2013

Artistas

António Azenha

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Terça a sábado 14h00 às 18h00

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Organização
Círculo de Artes Plásticas de Coimbra

Secretariado
Ivone Antunes

Texto
Gonçalo Furtado

Direção de Arte
Artur Rebelo
Lizá Ramalho
João Bicker

Design Gráfico
unit-lab, por
Francisco Pires e Marisa Leiria

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