Ana Hatherly (1929–2015) > Obrigatório não Ver
Ana Hatherly
2016
até 
30
April 2016
Círculo Sede
Ana Hatherly (1929–2015) > Obrigatório não Ver

Ana Hatherly (1929–2015) > Obrigatório não Ver

Exposição Coletiva

Ana Hatherly (1929–2015) > Obrigatório não Ver

Exposição Coletiva

1
April 2016
a
30
April 2016
Círculo Sede

Exposição panorâmica, literária e visual

A obra poética e visual de Ana Hatherly integra-se, no cânone literário e estético do século XX, na vanguarda da Poesia Experimental Portuguesa. Esta surge, na década de 60, inserida num contexto internacional que coloca em destaque a problemática da comunicação escrita e visual, à margem das literaturas e dos movimentos consagrados como eram o Futurismo/Modernismo de Orpheu e o Surrealismo. Razão para Ana Hatherly e E. M. de Melo e Castro escreverem sobre os fundamentos desta vanguarda e publicarem PO.EX: Textos Teóricos e Documentos da Poesia Experimental Portuguesa (1981).

Em paralelo, enquanto professora universitária e ensaísta, investiga os textos do Maneirismo e do Barroco, num segmento da literatura portuguesa dos séculos XVI a XVIII que confina com as artes plásticas, ou seja, identifica e antologia textos visuais que representam um contributo para o que designou ser «uma arqueologia da poesia experimental» (A Experiência do Prodígio, Lisboa, 1983).

Em 1978, Ana Hatherly considera que a «Arte não é sinónimo de produção de um determinado objeto. É hoje um conceito que aponta sobretudo para a mais vasta e profunda forma possível de comunicação/intervenção» (Ana Hatherly, Lisboa, 1992). É nesta conceção que assenta o postulado que lhe permite, por um lado, romper com a tradição da materialização do objeto artístico e, por outro, explorar diferentes linguagens e territórios que conferem à sua obra uma identidade única e que a tornam intensamente contemporânea. Não admira que o caminho encetado de internacionalização da arte contemporânea portuguesa, após o 25 de Abril de 1974, encontrou na sua obra uma voz pioneira e singular para a representar na Bienal de Veneza, nas edições de 1976 e 1978, sendo que de permeio participou na Bienal de São Paulo.

A publicação do livro de poesia Um Ritmo Perdido em 1958 assinala a sua estreia literária, enquanto o romance O Mestre, que surge em 1963, conhece várias reedições. Com 39 Tisanas (1969) inaugura um conhecido ciclo de quatro livros dedicados à meditação poética sobre a «escrita como pintura e filtro da vida», em que 463 Tisanas (2006) constitui o último volume publicado. Num exercício de autorreflexão e de lucidez, afirma que o seu trabalho começou com a escrita e daí deriva para a pintura, através da experimentação da caligrafia e da palavra. Exemplo disso são os livros de artista que Ana Hatherly publicou e de que se destacam os seguintes títulos: Mapas da Imaginação e da Memória (1973), O Escritor (1975) e A Reinvenção da Leitura (1975). Neles desvela o desenho escrito. Muitos destes primeiros desenhos foram influenciados pelo estudo de caligrafias e das filosofias orientais. Na experiência de desenhar carateres e na fluência do seu conhecimento sobre eles tomou consciência e observou a sua «mão tornar-se inteligente», como se pode ler em Mapas da Imaginação e da Memória. São estes livros de artista e o tema camoniano que suportam os núcleos de desenhos escritos que agora se mostram a público, no contexto da Semana Cultural da Universidade de Coimbra que elegeu o livro como tema central.

A amplitude e a versatilidade dos seus interesses levam-na a estudar cinematografia na London International Film School. Ali realizou três filmes, sendo o primeiro The Thought Fox (1972). Ao passar por Portugal, é atraída pelos acontecimentos e transformações sociais que resultam do 25 de Abril de 1974. Em consequência, realiza Revolução em 1975. Este constitui um fascinante documento fílmico e, ao mesmo tempo, um estudo das pinturas murais e dos cartazes políticos que então invadiram as ruas das cidades portuguesas e de Lisboa em particular, e um registo sonoro das vozes mais emblemáticas dos principais protagonistas políticos desses acontecimentos. Tomou, assim, uma clara consciência do enorme potencial visual que este tipo inscrições possuem no espaço público. Seguem-se em 1976 O que é a Ciência (I e II). E no ano de 1977 em que participa na Alternativa Zero, a convite de Ernesto de Sousa, com a instalação/performance Poema d’Entro, realiza Música Negativa e Rotura. Neste conjunto de trabalhos de índole política insere-se também a série de nove cartazes de As Ruas de Lisboa, em que usa a técnica surrealista da «collage» de fragmentos rasgados de cartazes políticos e de espetáculos de circo, obtendo um efeito visual policromático extraordinário com este tipo diferente de inscrições e de imagens parcelares. A propósito, em 1980, o CAPC acolheu, em exposição individual de Ana Hatherly, este conjunto de obras, então com a designação de Descolagens na Cidade.

Outra dimensão da sua obra é o trabalho de divulgação que realizou sobre a arte de vanguarda em Portugal, durante as décadas de 60 a 80, ao dar a conhecer, por exemplo, no campo da música, os concertos de John Cage, a dança de Merce Cunningham na sua ligação com Rauschenberg, ou a música de Jorge Peixinho e de Jorge Lima Barreto. A música parece soar como uma espécie de pano de fundo de todo o seu trabalho. Importa recordar, a este respeito, que também fez estudos musicais em Portugal, França e Alemanha. Porém, a atividade de divulgadora de Ana Hatherly desdobra-se pela colaboração em jornais, programas na rádio (RDP2) e na televisão. Obrigatório não Ver foi o título provocatório de uma série que apresentou e que foi emitida regularmente na RTP2, depois da meia-noite, em 1978 e 1979. Foi um dos primeiros programas portugueses a ser vendido para várias televisões estrangeiras. Publicou o livro homónimo Obrigatório não Ver (2009) para reconstituir os guiões do programa, pois a estação pública não conserva as suas imagens em arquivo, além de reunir nele um conjunto de textos publicados na imprensa.

É importante constatar que nos últimos trabalhos da série Neograffiti (2001) Ana Hatherly utiliza a técnica de spray sobre papel, apropriando-se de uma linguagem própria das subculturas urbanas solidárias e que é praticada, normalmente, em ambiente noturno (cf. João Lima Pinharanda em Ana Hatherly: A Mão Inteligente, Lisboa, 2003). E, de certo modo, conclui mais um ciclo, ao regressar ao tema da escrita mural que a ocupara na década de 70, mas agora num ambiente de solidão criativa. Por ele prolonga e faz confluir a sua investigação formal e linguística, ao mesmo tempo que reinventa a sua obra poética e visual.

Jorge Pais de Sousa

Exposição panorâmica, literária e visual

A obra poética e visual de Ana Hatherly integra-se, no cânone literário e estético do século XX, na vanguarda da Poesia Experimental Portuguesa. Esta surge, na década de 60, inserida num contexto internacional que coloca em destaque a problemática da comunicação escrita e visual, à margem das literaturas e dos movimentos consagrados como eram o Futurismo/Modernismo de Orpheu e o Surrealismo. Razão para Ana Hatherly e E. M. de Melo e Castro escreverem sobre os fundamentos desta vanguarda e publicarem PO.EX: Textos Teóricos e Documentos da Poesia Experimental Portuguesa (1981).

Em paralelo, enquanto professora universitária e ensaísta, investiga os textos do Maneirismo e do Barroco, num segmento da literatura portuguesa dos séculos XVI a XVIII que confina com as artes plásticas, ou seja, identifica e antologia textos visuais que representam um contributo para o que designou ser «uma arqueologia da poesia experimental» (A Experiência do Prodígio, Lisboa, 1983).

Em 1978, Ana Hatherly considera que a «Arte não é sinónimo de produção de um determinado objeto. É hoje um conceito que aponta sobretudo para a mais vasta e profunda forma possível de comunicação/intervenção» (Ana Hatherly, Lisboa, 1992). É nesta conceção que assenta o postulado que lhe permite, por um lado, romper com a tradição da materialização do objeto artístico e, por outro, explorar diferentes linguagens e territórios que conferem à sua obra uma identidade única e que a tornam intensamente contemporânea. Não admira que o caminho encetado de internacionalização da arte contemporânea portuguesa, após o 25 de Abril de 1974, encontrou na sua obra uma voz pioneira e singular para a representar na Bienal de Veneza, nas edições de 1976 e 1978, sendo que de permeio participou na Bienal de São Paulo.

A publicação do livro de poesia Um Ritmo Perdido em 1958 assinala a sua estreia literária, enquanto o romance O Mestre, que surge em 1963, conhece várias reedições. Com 39 Tisanas (1969) inaugura um conhecido ciclo de quatro livros dedicados à meditação poética sobre a «escrita como pintura e filtro da vida», em que 463 Tisanas (2006) constitui o último volume publicado. Num exercício de autorreflexão e de lucidez, afirma que o seu trabalho começou com a escrita e daí deriva para a pintura, através da experimentação da caligrafia e da palavra. Exemplo disso são os livros de artista que Ana Hatherly publicou e de que se destacam os seguintes títulos: Mapas da Imaginação e da Memória (1973), O Escritor (1975) e A Reinvenção da Leitura (1975). Neles desvela o desenho escrito. Muitos destes primeiros desenhos foram influenciados pelo estudo de caligrafias e das filosofias orientais. Na experiência de desenhar carateres e na fluência do seu conhecimento sobre eles tomou consciência e observou a sua «mão tornar-se inteligente», como se pode ler em Mapas da Imaginação e da Memória. São estes livros de artista e o tema camoniano que suportam os núcleos de desenhos escritos que agora se mostram a público, no contexto da Semana Cultural da Universidade de Coimbra que elegeu o livro como tema central.

A amplitude e a versatilidade dos seus interesses levam-na a estudar cinematografia na London International Film School. Ali realizou três filmes, sendo o primeiro The Thought Fox (1972). Ao passar por Portugal, é atraída pelos acontecimentos e transformações sociais que resultam do 25 de Abril de 1974. Em consequência, realiza Revolução em 1975. Este constitui um fascinante documento fílmico e, ao mesmo tempo, um estudo das pinturas murais e dos cartazes políticos que então invadiram as ruas das cidades portuguesas e de Lisboa em particular, e um registo sonoro das vozes mais emblemáticas dos principais protagonistas políticos desses acontecimentos. Tomou, assim, uma clara consciência do enorme potencial visual que este tipo inscrições possuem no espaço público. Seguem-se em 1976 O que é a Ciência (I e II). E no ano de 1977 em que participa na Alternativa Zero, a convite de Ernesto de Sousa, com a instalação/performance Poema d’Entro, realiza Música Negativa e Rotura. Neste conjunto de trabalhos de índole política insere-se também a série de nove cartazes de As Ruas de Lisboa, em que usa a técnica surrealista da «collage» de fragmentos rasgados de cartazes políticos e de espetáculos de circo, obtendo um efeito visual policromático extraordinário com este tipo diferente de inscrições e de imagens parcelares. A propósito, em 1980, o CAPC acolheu, em exposição individual de Ana Hatherly, este conjunto de obras, então com a designação de Descolagens na Cidade.

Outra dimensão da sua obra é o trabalho de divulgação que realizou sobre a arte de vanguarda em Portugal, durante as décadas de 60 a 80, ao dar a conhecer, por exemplo, no campo da música, os concertos de John Cage, a dança de Merce Cunningham na sua ligação com Rauschenberg, ou a música de Jorge Peixinho e de Jorge Lima Barreto. A música parece soar como uma espécie de pano de fundo de todo o seu trabalho. Importa recordar, a este respeito, que também fez estudos musicais em Portugal, França e Alemanha. Porém, a atividade de divulgadora de Ana Hatherly desdobra-se pela colaboração em jornais, programas na rádio (RDP2) e na televisão. Obrigatório não Ver foi o título provocatório de uma série que apresentou e que foi emitida regularmente na RTP2, depois da meia-noite, em 1978 e 1979. Foi um dos primeiros programas portugueses a ser vendido para várias televisões estrangeiras. Publicou o livro homónimo Obrigatório não Ver (2009) para reconstituir os guiões do programa, pois a estação pública não conserva as suas imagens em arquivo, além de reunir nele um conjunto de textos publicados na imprensa.

É importante constatar que nos últimos trabalhos da série Neograffiti (2001) Ana Hatherly utiliza a técnica de spray sobre papel, apropriando-se de uma linguagem própria das subculturas urbanas solidárias e que é praticada, normalmente, em ambiente noturno (cf. João Lima Pinharanda em Ana Hatherly: A Mão Inteligente, Lisboa, 2003). E, de certo modo, conclui mais um ciclo, ao regressar ao tema da escrita mural que a ocupara na década de 70, mas agora num ambiente de solidão criativa. Por ele prolonga e faz confluir a sua investigação formal e linguística, ao mesmo tempo que reinventa a sua obra poética e visual.

Jorge Pais de Sousa

Artistas

Ana Hatherly

Obras

No items found.

Curadoria

No items found.

Vistas da Exposição

No items found.
No items found.

Vídeo

Localização e horário

Localização

Localização

Terça a sábado 14h00 às 18h00

Ligação Externa

Atividades associadas

Não foram encontradas atividades associadas.

Agradecimentos

João Silvério Fundação Luso-Americana para o Desenvolvimento Leonor Nazaré Ana Vasconcelos CAM Fundação Calouste Gulbenkian Fernando Aguiar Arquivo de Poesia Experimental Fernando Aguiar José Carlos Seabra Pereira Luís Alves de Matos

Notícias Associadas

Mais informações

Exposição co-produzida no âmbito da 18ª Semana Cultural da Universidade de Coimbra.

Ficha técnica

Abrir ficha técnica

Organização
Círculo de Artes Plásticas de Coimbra

Produção
Mariana Abrantes
Pedro Sá Valentim
Universidade de Coimbra

Montagem
Jorge das Neves
Laurindo Marta
Paulo Castanheira

Texto
Jorge Pais de Sousa

Tradução
Hugo Carriço (Estagiário FLUC)

Fotografia
Maria José Palla

Fotografias da exposição
Jorge das Neves

Arquivo e Documentação
Cláudia Paiva

Design Gráfico
Projeto de Imagem, Media e Comunicação da Universidade de Coimbra

Apoios

No items found.

Apoios institucionais