“Tout l’abrupt de la philosophie est lá; si proche de
l’unique autre abrupt, la mort, qu’avant même de
savoir pourquoi, les hommes virent dans ces deux mots
un seul abîme. Comme la mer dans une poignée de son
eau; comme Christ entier dans cette goutte de son sang;
comme dans une feuille d’arbre tout le calcul de Dieu,
ou la dialéctique des hommes.”
Louis Althusser1
É difícil escrever sobre a imagem do inerte. Um medium veloz e mecânico (a fotografia) detém-se sobre um depósito lento e em repouso, alienando o espaço (a profundidade) em favor do corpo (da superfície). A presença (a atividade fotogénica) do inanimado revive uma citação que Robert Morris recupera de Goethe3 e que coloca logo na entrada da Parte I do Notes on sculpture (1966): “Aquilo que se torna aparente tem que segregar de modo a aparecer”4. A pedra bruta, matéria pura, destituída de ação humana torna-se, aqui, o “objeto teórico- o múltiplo sem original, (…) destruidor da unidade do todo” de que nos fala Rosalind Krauss5. No seu laconismo estas pedras fotografadas, pedras brutas (será que, como as de Prometeu, estas também tem odor humano?), situadas na planaridade (e na mise-en-scéne) de um retângulo, tem a força de um problema filosófico – o que é a matéria? O que é uma experiência da matéria? É o seu uso?
Apropriação, contacto, separação do todo? Ou será que aquilo que nos fica da matéria é a sua memória e o imprevisto (e perecível) que acompanham essa memória – a amnésia, a mentira, como naquele espelho que agora cessou de existir, que já não está naquele lugar sem identidade (um jardim particular? Um parque? Um baldio? Uma floresta?).Um espelho que permanece inquietamente estático. Como pode ser um espelho se a imagem não é derivativa, dispersiva? Ao fotografarmos um espelho será que não estamos a cancelar a sua essência? (…)
Manuela Marques cria aqui um fragmento, uma interrupção (cinemática, porque o espelho é o cinema ou a fotografia sem memória, um cinema efémero feito dos múltiplos sinais cinéticos do representado), uma interrupção no “infindo informe” que é a natureza mas, em simultâneo, ela coloca-nos fora dessa interrupção, diante da imagem (fixa) dessa imagem (móvel), diante do verbo (da ação) separado da sua natureza. (…)
Pedro Pousada
Abril de 2015
“Tout l’abrupt de la philosophie est lá; si proche de
l’unique autre abrupt, la mort, qu’avant même de
savoir pourquoi, les hommes virent dans ces deux mots
un seul abîme. Comme la mer dans une poignée de son
eau; comme Christ entier dans cette goutte de son sang;
comme dans une feuille d’arbre tout le calcul de Dieu,
ou la dialéctique des hommes.”
Louis Althusser1
É difícil escrever sobre a imagem do inerte. Um medium veloz e mecânico (a fotografia) detém-se sobre um depósito lento e em repouso, alienando o espaço (a profundidade) em favor do corpo (da superfície). A presença (a atividade fotogénica) do inanimado revive uma citação que Robert Morris recupera de Goethe3 e que coloca logo na entrada da Parte I do Notes on sculpture (1966): “Aquilo que se torna aparente tem que segregar de modo a aparecer”4. A pedra bruta, matéria pura, destituída de ação humana torna-se, aqui, o “objeto teórico- o múltiplo sem original, (…) destruidor da unidade do todo” de que nos fala Rosalind Krauss5. No seu laconismo estas pedras fotografadas, pedras brutas (será que, como as de Prometeu, estas também tem odor humano?), situadas na planaridade (e na mise-en-scéne) de um retângulo, tem a força de um problema filosófico – o que é a matéria? O que é uma experiência da matéria? É o seu uso?
Apropriação, contacto, separação do todo? Ou será que aquilo que nos fica da matéria é a sua memória e o imprevisto (e perecível) que acompanham essa memória – a amnésia, a mentira, como naquele espelho que agora cessou de existir, que já não está naquele lugar sem identidade (um jardim particular? Um parque? Um baldio? Uma floresta?).Um espelho que permanece inquietamente estático. Como pode ser um espelho se a imagem não é derivativa, dispersiva? Ao fotografarmos um espelho será que não estamos a cancelar a sua essência? (…)
Manuela Marques cria aqui um fragmento, uma interrupção (cinemática, porque o espelho é o cinema ou a fotografia sem memória, um cinema efémero feito dos múltiplos sinais cinéticos do representado), uma interrupção no “infindo informe” que é a natureza mas, em simultâneo, ela coloca-nos fora dessa interrupção, diante da imagem (fixa) dessa imagem (móvel), diante do verbo (da ação) separado da sua natureza. (…)
Pedro Pousada
Abril de 2015
Organização
Círculo de Artes Plásticas de Coimbra
Produção
Joana Jeremias
Mariana Abrantes
Mariana Martins
Mariana Roque
Montagem
Jorge Neves
Luís Sequeira
Fotografia
Jorge Neves
Imagem e Som
Diogo Pereira
Texto
Pedro Pousada
Secretariado
Ivone Antunes
Arquivo e Biblioteca
Cláudia Paiva
Direção de Arte
Artur Rebelo
Lizá Ramalho
João Bicker
Design Gráfico
unit-lab, por
Francisco Pires e Marisa Leiria