O desenho é transversal às mais diversas práticas artísticas contemporâneas e apesar das diferentes aproximações – eminentemente conceptuais, narrativas ou informais – é muitas vezes (e também aqui) uma actividade quotidiana de inscrição de um lugar, das suas características e história(s).
E de entre todos os lugares, o lugar casa é aquele que enquanto território de afirmação pessoal, palco de acções quotidianas e repositório de objectos de uso diário, encerra em si próprio mais características e funções comuns.
As obras que integram a exposição indiciam, ou denunciam, a eleição de objectos para esse uso diário e a forma como estes se relacionam com práticas circunscritas ao lugar casa, contendo vestígios, memórias e marcas dessa vivência.
Os trabalhos apresentados performatizam e contestam a insignificância de cada pequena actividade e de cada objecto utilizado, e ressalvam o papel do improviso e do acaso na construção da uma identidade e vivência singulares.
A obra Museu de coisas insignificantes recupera deliberadamente o livro homónimo de poemas de Charles Kiefer. Uma possível interpretação dos seus poemas diz-nos que aceitar esse museu significa aceitar que as coisas insignificantes podem afinal ter significado; não um significado próprio, único e imutável, mas um significado atribuído e permeável; implicará ainda a aceitação de que todo o museu é formado por coisas insignificantes e que o significado (e o valor) dessas coisas não está contido nelas próprias mas na relação que com elas podemos manter.
Com facilidade se transpõem o que acaba de ser dito sobre o museu para o quotidiano de cada um de nós: um processo cumulativo de selecção de objectos, práticas, gestos e lugares, visando a construção de uma rotina e simultaneamente da sua possibilidade de fuga.
Muitas vezes esta fuga ou disrupção acontece de forma acidental ou quase inconsciente – fruto do acaso. O acaso imponderável e imprevisível acrescenta e desvia mas de igual forma talha e molda a nossa história e aquilo que somos.
Rita Gaspar Vieira transforma a matéria-prima papel, afrontando peso e bidimensionalidade, em objectos de particular e delicada beleza mas também em monumentais registos e memórias, inscritos, embebidos e compostos de pesada e escura grafite.
Marca d’água replica o rodapé de duas paredes de uma das salas da (casa) sede do CAPC. Esta mimetização formal e cromática (pois também a sala é negra), enfatizada pelo deslocamento do molde em relação ao modelo, confere à peça o seu valor enquanto reprodução e registo das características da própria sala.
A vida quotidiana – as suas rotinas, as suas ausências, os seus acasos, as suas escolhas, as suas cicatrizes, as suas fugas, as suas acções e as suas consequências são matéria-prima, assunto e programa das obras da exposição, corporalizando a cada momento a tricotomia verbo – acção -registo.
— Andreia Poças, Abril de 2014
O desenho é transversal às mais diversas práticas artísticas contemporâneas e apesar das diferentes aproximações – eminentemente conceptuais, narrativas ou informais – é muitas vezes (e também aqui) uma actividade quotidiana de inscrição de um lugar, das suas características e história(s).
E de entre todos os lugares, o lugar casa é aquele que enquanto território de afirmação pessoal, palco de acções quotidianas e repositório de objectos de uso diário, encerra em si próprio mais características e funções comuns.
As obras que integram a exposição indiciam, ou denunciam, a eleição de objectos para esse uso diário e a forma como estes se relacionam com práticas circunscritas ao lugar casa, contendo vestígios, memórias e marcas dessa vivência.
Os trabalhos apresentados performatizam e contestam a insignificância de cada pequena actividade e de cada objecto utilizado, e ressalvam o papel do improviso e do acaso na construção da uma identidade e vivência singulares.
A obra Museu de coisas insignificantes recupera deliberadamente o livro homónimo de poemas de Charles Kiefer. Uma possível interpretação dos seus poemas diz-nos que aceitar esse museu significa aceitar que as coisas insignificantes podem afinal ter significado; não um significado próprio, único e imutável, mas um significado atribuído e permeável; implicará ainda a aceitação de que todo o museu é formado por coisas insignificantes e que o significado (e o valor) dessas coisas não está contido nelas próprias mas na relação que com elas podemos manter.
Com facilidade se transpõem o que acaba de ser dito sobre o museu para o quotidiano de cada um de nós: um processo cumulativo de selecção de objectos, práticas, gestos e lugares, visando a construção de uma rotina e simultaneamente da sua possibilidade de fuga.
Muitas vezes esta fuga ou disrupção acontece de forma acidental ou quase inconsciente – fruto do acaso. O acaso imponderável e imprevisível acrescenta e desvia mas de igual forma talha e molda a nossa história e aquilo que somos.
Rita Gaspar Vieira transforma a matéria-prima papel, afrontando peso e bidimensionalidade, em objectos de particular e delicada beleza mas também em monumentais registos e memórias, inscritos, embebidos e compostos de pesada e escura grafite.
Marca d’água replica o rodapé de duas paredes de uma das salas da (casa) sede do CAPC. Esta mimetização formal e cromática (pois também a sala é negra), enfatizada pelo deslocamento do molde em relação ao modelo, confere à peça o seu valor enquanto reprodução e registo das características da própria sala.
A vida quotidiana – as suas rotinas, as suas ausências, os seus acasos, as suas escolhas, as suas cicatrizes, as suas fugas, as suas acções e as suas consequências são matéria-prima, assunto e programa das obras da exposição, corporalizando a cada momento a tricotomia verbo – acção -registo.
— Andreia Poças, Abril de 2014
Organização
Círculo de Artes Plásticas de Coimbra
Montagem
Círculo de Artes Plásticas de Coimbra
Secretariado
Ivone Antunes
Texto
Andreia Poças
Direção de Arte
Artur Rebelo
Lizá Ramalho
João Bicker
Design Gráfico
unit-lab, por
Francisco Pires e Marisa Leiria